Domingo, 8 de Janeiro de 2012
publicado por JN em 8/1/12

A continuação temporária de Júlio Magalhães no Jornal das 8, agora como colaborador, é uma prova do peso que Marcelo Rebelo de Sousa tem na TVI e, aliás, na TV portuguesa em geral. Mas a conjuntura não é favorável ao professor – e a demissão de Magalhães, assim como o término do seu actual contrato com Queluz, são apenas parte do problema. Marcelo é líder incontestado entre os comentadores, mas talvez não seja um comentador para um tempo de crise. Os seus comentários são espirituosos e divertidos, sim. Só que também são redondos e fundamentalmente lúdicos. Na verdade, só são “especializados” quando se trata do jogo político puro e duro. Ora, em regra, isso é uma virtude, sobretudo tendo em conta o perfil da TV em sinal aberto. Chegamos, porém, a um momento em que a recessão não é apenas uma coisa dos telejornais, mas uma realidade comprovável na vida das famílias, incluindo menos trabalho e menos rendimento, mais impostos e mais desespero. A partir daqui, pois, não serão o espírito e a retórica a fazer a diferença: serão a assertividade e as soluções concretas. E Marcelo Rebelo de Sousa sempre foi melhor a problematizar do que a resolver. Para além de tudo, o calendário eleitoral começa a impor-se. Se o antigo presidente do PSD efectivamente acalenta alguma ambição de chegar à Presidência da República, em algum momento terá de sair de cena, de forma a readquirir o consenso que apenas a obscuridade permite. Tendo em conta que as eleições são em 2015, o ideal seria talvez desaparecer em 2013. Mas Maio, data em que termina o actual contrato com a TVI, também pode ser uma boa solução.

 

CRÓNICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 6 de Janeiro de 2012

Domingo, 15 de Agosto de 2010
publicado por JN em 15/8/10

Ao pé daquilo em que a reality TV se transformou entretanto, a primeira edição de Big Brother era uma brincadeira de crianças. Como muito bem explicava ontem Marta Cardoso numa entrevista ao Correio da Manhã, nem ela, nem Zé Maria, nem Marco, nem Susana, nem Célia, nem Telmo – todos aqueles que, no fundo, se tornaram objecto ao mesmo tempo do nosso voyeurismo, da nossa ternura e até da nossa vergonha – tinham, no momento em que entraram para “a casa” (faz agora dez anos), a mínima ideia daquilo ao que iam.

Sabiam que as câmaras estavam presentes, sim. Imaginavam que, lá em casa, pelo menos algumas pessoas seguiriam as suas tontices. Mas não podiam supor que o programa houvesse entretanto tomado de assalto a actualidade – e, quando se punham aos abraços ou aos pontapés, aos beijos ou aos coitos silenciosos sob os edredões, faziam-no porque as suas emoções os impeliam a isso, não porque percebessem o alcance (e sobretudo as vantagens estratégicas) desses gestos.

Recuperar o Big Brother, por esta altura, tem seguramente alguma coisa de vintage. Para o bem e para o mal (sobretudo para o mal), aquele foi, provavelmente, o mais importante programa da televisão nos últimos vinte ou trinta anos – uma revolução que mudou quase tudo e que ainda hoje produz significativos efeitos. Mas recuperá-lo com novas personagens, sobretudo sabendo essas personagens o que puderam perceber entretanto, será como ouvir música dos anos 80 feita nos dias de hoje.

Soará a falso, o novo Big Brother da TVI (e chame-se ele Big Brother, Secret Story ou o que seja). Como objecto de estudo sociológico, valerá pouco mais do que zero. E, ao mesmo tempo, será muito mais inofensivo.

CRÓNICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 15 de Agosto de 2010

Sábado, 31 de Julho de 2010
publicado por JN em 31/7/10



A morte de António Feio é lamentável. António Feio era um actor talentoso e uma personalidade ternurenta – e, numa altura em que a arrogância é cada vez mais um disfarce para a falta de talento, torna-se duplamente triste vê-lo partir. Mas tão lamentável como a sua morte é constatar a forma como a TV e a imprensa escrita, a rádio e até o cinema se aproveitaram da sua fragilidade neste ano e meio, persuadindo-a uma recta final de vida especialmente conspícua, que será útil à sua memória imediata, mas em nada favorecerá a sua memória futura.


Dirão muitos que esta morte em público “ajudou a consciencializar-nos” quanto ao cancro no pâncreas. Mentira. Se de alguma coisa sempre estivemos conscientes, foi da existência do cancro – e, quanto ao cancro pancretárico propriamente dito, ficámos todos na mesma, ignorantes ainda quanto a causas e sintomas (embora talvez mais cientes de que mata quase sempre). Dirão outros que, se António Feio viveu a sua doença em público, foi porque quis. Concedo: ele qui-lo. Mas não quis tudo o que aconteceu – e, aliás, mesmo querendo, várias coisas não deviam ter chegado sequer a ser-lhe propostas.


Ao longo de um ano e meio, António Feio foi entrevistado, condecorado e até ouvido para um trailer cinematográfico inédito. Mas também foi convidado para programas tontos, questionado sobre como se sentiu perante a morte de Patrick Swayze e usado para quase tudo o que foi dossier e caixinha sobre “famosos aflitos”. Aceitou quase sempre, suponho, porque estava desesperado, o que é o mais humano de tudo. Já nós, profissionais dos media, fomos oportunistas, mesmo obscenos – e devíamos todos ter vergonha de ter feito dele uma mascote.


CRÓNICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 31 de Julho de 2010

Joel Neto


Joel Neto nasceu em Angra do Heroísmo, em 1974, e vive entre o coração de Lisboa e a freguesia rural da Terra Chã, na ilha Terceira. Publicou, entre outros, “O Terceiro Servo” (romance, 2000), “O Citroën Que Escrevia Novelas Mexicanas” (contos, 2002) e “Banda Sonora Para Um Regresso a Casa” (crónicas, 2011). Está traduzido em Inglaterra e na Polónia, editado no Brasil e representado em antologias em Espanha, Itália e Brasil, para além de Portugal. Jornalista de origem, trabalhou na imprensa, na televisão e na rádio, como repórter, editor, autor de conteúdos e apresentador. Hoje, dedica-se sobretudo à crónica e ao comentário, que desenvolve a par da escrita de ficção. O seu novo romance, “Os Sítios Sem Resposta”, sai em Abril de 2012, com chancela da Porto Editora. (saber mais)
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"Os Sítios Sem Resposta",
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"O Citroën Que Escrevia
Novelas Mexicanas",
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"O Terceiro Servo"
ROMANCE,
Editorial Presença,
2002
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Bíblia do Golfe
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"Banda Sonora Para
Um Regresso a Casa
CRÓNICAS,
Porto Editora,
2011
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"Crónica de Ouro
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"Todos Nascemos Benfiquistas
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CRÓNICAS,
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2007
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"José Mourinho, O Vencedor",
BIOGRAFIA,
Publicações Dom Quixote,
2004
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"Al-Jazeera, Meu Amor",
CRÓNICAS,
Editorial Prefácio
2003
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