Os Sítios Sem Resposta
ROMANCE, Porto Editora, 2012
A editar em Abril de 2012. Alguns esboços:
«Pus-me ao lado dele, a enxaguar a loiça que ele lavava, e verifiquei que não notava já o seu cheiro tépido e doce, aquele cheiro só dele que eu conseguiria identificar em qualquer lugar do mundo. Provavelmente, não o perdera: eu é que, em definitivo, passara a cheirar como ele.»
«Tratava-nos muitas vezes por Miguel a mim e por filho a ele. Às vezes, porém, tratava-me a mim por amigo, o que era mais do que aquilo a que Nuno podia aspirar.»
«Para ser sincero, e apesar das já quase duas décadas de exílio, eu continuava a voltar à terra como se realmente pudesse acordar ao contrário, contorcendo-me e espreguiçando-me e depois fechando-me em concha, até, enfim, adormecer.»
«E eu não soube o que dizer-lhe, porque percebia que uma mulher amarga, complexada e arrivista, agressiva e globalmente imprópria, podia ser mais amável do que a mulher perfeita, assim tivesse uma história connosco, assim nos unisse a ela uma intimidade que a mais ninguém fosse acessível, assim fosse nossa como nenhuma outra.»
«E, então, sim, galgou para cima de mim, fechou os olhos, ergueu o queixo e pôs-se a subir e a descer sobre o meu ventre, num ritmo triunfal, quase numa apoteose, com a planta dos pés assentes com firmeza sobre o colchão e o ar convicto de quem enfrenta uma espécie de inevitabilidade, ou talvez tenta tirar o melhor partido possível de uma coisa primordialmente desagradável.»
«Por muito que eu me tivesse esforçado, e ainda que o tivesse mesmo feito, jamais conseguiria ser durante cinco minutos metade daquilo que ele fora ao longo de toda a vida, sem uma hesitação, sem uma ressalva, sem outra intenção que não apenas sê-lo.»