Domingo, 24 de Janeiro de 2010
publicado por JN em 24/1/10

Sempre desconfiei da música cómica, sobretudo se tocada em tom nonsense – e que alguém algum dia chame “música” ao teatro musical (concedamos que se trata disso) dos Irmãos Catita ou de algum dos seus sucedâneos, Cebola Mol incluídos, é coisa que jamais deixou de provocar-me estranheza. De mesma forma que há escritores e “gente que escreve”, o que está longe de ser a mesma coisa, há músicos e “gente que toca” (ou canta). Os livros de quem escreve são livros, sim – mas nunca literatura. Os discos de quem toca são discos, sim – mas nunca música.


Pois os mesmos eufemismos se aplicarão a dois terços (ou três quatros, ou quatro quintos) dos temas candidatos ao Festival da Canção, incluindo os deste ano. Quem acompanha o velho certame da RTP, aliás, já não o faz sequer para ouvir música: fá-lo para assistir à festa, para ver os vestidos das raparigas, quando muito para accionar dentro de si próprio campainhas que evocam outros tempos. Se o faz no intuito de ouvir música, isso já diz mais sobre a limitação do seu entendimento do que sobre as potencialidades dos temas a concurso. E não me digam que gostos não se discutem, por favor: tirando exercê-los, não há mesmo nada melhor para fazer com os gostos do que discuti-los.

Isto para dizer que a exclusão dos Homens da Luta do Festival RTP da Canção, baseada numa tecnicalidade rebuscadíssima (a canção já teria sido ouvida em público, como de resto todas as canções cujos compositores testaram na família, nos amigos ou num grupo de editores), é um absurdo. Na verdade, os Homens da Luta tinham lugar no Festival. Lá está: é uma festa, não um tributo à música – e a própria festa, aliás, já precisava de alguma animação.


CRÓNICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 24 de Janeiro de 2010

Comentar:
De
( )Anónimo- este blog não permite a publicação de comentários anónimos.
(moderado)
Ainda não tem um Blog no SAPO? Crie já um. É grátis.

Comentário

Máximo de 4300 caracteres



Copiar caracteres

 


Joel Neto


Joel Neto nasceu em Angra do Heroísmo, em 1974, e vive entre o coração de Lisboa e a freguesia rural da Terra Chã, na ilha Terceira. Publicou, entre outros, “O Terceiro Servo” (romance, 2000), “O Citroën Que Escrevia Novelas Mexicanas” (contos, 2002) e “Banda Sonora Para Um Regresso a Casa” (crónicas, 2011). Está traduzido em Inglaterra e na Polónia, editado no Brasil e representado em antologias em Espanha, Itália e Brasil, para além de Portugal. Jornalista de origem, trabalhou na imprensa, na televisão e na rádio, como repórter, editor, autor de conteúdos e apresentador. Hoje, dedica-se sobretudo à crónica e ao comentário, que desenvolve a par da escrita de ficção. O seu novo romance, “Os Sítios Sem Resposta”, sai em Abril de 2012, com chancela da Porto Editora. (saber mais)
pesquisar neste blog
 
arquivos
livros de ficção

"Os Sítios Sem Resposta",
ROMANCE,
Porto Editora,
2012
Saber mais


"O Citroën Que Escrevia
Novelas Mexicanas",
CONTOS,
Editorial Presença,
2002
Saber mais
Comprar aqui


"O Terceiro Servo"
ROMANCE,
Editorial Presença,
2002
Saber mais
Comprar aqui
outros livros

Bíblia do Golfe
DIVULGAÇÃO,
Prime Books
2011
Saber mais
Comprar aqui


"Banda Sonora Para
Um Regresso a Casa
CRÓNICAS,
Porto Editora,
2011
Saber mais
Comprar aqui


"Crónica de Ouro
do Futebol Português",
OBRA COLECTIVA,
Círculo de Leitores,
2008
Saber mais
Comprar aqui


"Todos Nascemos Benfiquistas
(Mas Depois Alguns Crescem)",
CRÓNICAS,
Esfera dos Livros,
2007
Saber mais
Comprar aqui


"José Mourinho, O Vencedor",
BIOGRAFIA,
Publicações Dom Quixote,
2004
Saber mais
Comprar aqui


"Al-Jazeera, Meu Amor",
CRÓNICAS,
Editorial Prefácio
2003
Saber mais
Comprar aqui